Artigo 5 – Ética

por Marcelo Veras | 30 de mar de 2012

“Ninguém resiste a uma lente de aumento” (Max Franco)

No dicionário Aurélio está escrito: “Conjunto de normas e princípios que norteiam a boa conduta do ser humano”. É incrível como uma definição diz tudo e, ao mesmo tempo, não diz nada. Tão simples e tão complicada. Pergunte a dez pessoas o que é ser ético. Compare as respostas e comprove que este conceito é um dos mais aguados que você já viu na vida. Digo isso porque o termo chave da definição deixa uma lacuna enorme. O que significa “boa conduta”? Cada país, cidade, empresa ou pessoa tem o direito de definir? Quem julga? Quem tem autoridade moral para dizer o que é e o que não é boa conduta?

Sei que você pode estar pensando que ética está acima da moral e das leis. É questão pessoal, atemporal. Eu já ouvi muita gente falando sobre ética. Muita gente mesmo. Já li frases do tipo “Não fazer com os outros, aquilo que você não gostaria que fizessem com você”, ou “A vida em sociedade exige regras de convivência e que elas sejam obedecidas. Caso não exista este acordo social caímos na lei das selvas e do salve-se quem puder” (site do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial – www.etco.org.br). No mundo corporativo, em pesquisa recente com mais de 100 líderes empresariais, ética ganhou a seguinte definição: “Conduta idônea - conjunto de princípios morais que se deve observar no exercício da profissão”. Tudo muito lindo. Mas e aí? No fundo, o que é ser ético? E mais, existe alguém 100% ético?

No final das contas, assistindo a tudo que se passa neste nosso imenso Brasil, das organizações às posturas individuais no dia-a-dia, concluo que esta bandeira só pode ser levantada, se é que pode, por alguém que não deva nada. Absolutamente nada. Por alguém que tenha uma postura radical. Uma disciplina exemplar. Porque se não for assim, dependendo da definição de ética e de como as palavras são interpretadas, fica todo mundo de fora e frase acima do meu amigo Max vira a maior verdade já dita até hoje no mundo. E, embora goste dela, ainda me recuso a jogar a toalha.

Quando trato deste assunto com os meus alunos na ESAMC, vejo que muitos têm uma dúvida enorme a respeito de onde está a fronteira. Qual deve ser o tamanho do “delito” para ser considerado como falta de ética. Imprimir uma página do trabalho da faculdade na impressora da empresa é falta de ética? Comprar um CD pirata no camelô da esquina é falta de ética? Usar a rede da empresa para acessar email pessoal é falta de ética? Instalar um software pirata no computador é falta de ética? Omitir uma informação ou um fato é falta de ética? Será que atos aparentemente tão “irrelevantes” e que, também aparentemente, não fazem mal a ninguém precisam entrar nessa lista? De fato, como diz a minha amiga Carolina, “esta fronteira é da largura de um fio de cabelo”. Tenho certeza que qualquer um que fez uma das coisas listadas acima tem um caminhão de justificativas bem convincentes para justificar o ato. Um vai dizer que os impostos são muito altos na compra de CDs e tudo vai mesmo para o bolso dos políticos corruptos. Outro vai dizer que a empresa o faz trabalhar mais do que o horário às vezes e não paga hora extra. Ou que, se empresa me liga no horário de lazer, me dá o direito de usar parte do meu tempo de trabalho para resolver alguma questão pessoal.

Tecnicamente, existe uma definição, ela é aceita socialmente e creio que nunca foi tão discutida e cobrada como atualmente de pessoas e organizações. Entretanto questiono muito a forma como pessoas e organizações são categorizadas e rotuladas. O termo “faltou com ética” ou “foi ético” tem sido usado de forma pouco cautelosa, para não dizer outra coisa.

Acredito mais na moral, nas leis e nas regras sociais. Confesso que não tenho competência para julgar nem a mim, muito menos aos outros sobre questões éticas. Não tenho a pretensão de me safar de um ou outro deslize, até porque acho que não existe uma forma de vida hoje que nunca tenha cometido o seu. Mas, me sinto mais a vontade e seguro quando sei e conheço as regras do jogo. Quero as coisas claras, as expectativas colocadas em alto e bom tom. Quero que as relações de confiança se construam com bases claras. Daí me sinto tranquilo e me concentro 100% em respeitá-las. O que pode, pode. O que não pode, não pode. Na dúvida, senta-se, conversa-se e esclarece-se. Simples assim. Esta “lei”, para mim, deve ser estabelecida entre pessoas e organizações, entre pessoas e pessoas e na sociedade em geral.

Admiro pessoas coerentes. Aceito e convivo com a imperfeição, até porque estou longe de ser o exemplo da perfeição. Então prefiro conviver com pessoas que erram e assumem seus erros do que com pessoas que erram todo santo dia e posam de “guardiões da ética e da coisa certinha”. Tendo dito isso, confesso que, para mim, tanto a palavra como a definição de ética, não me fazem falta alguma. Toco a minha vida, respeitando os acordos que fiz e as regras que me foram colocadas, e não tenho medo nenhum de colocarem um telescópio apontado para mim.

E para os meus alunos, recomendo que conheçam e sigam as regras dos ambientes em que se encontram, estejam elas escritas, em um código de conduta, por exemplo, ou não. Assim, todos podem se concentrar no seu trabalho, na sua vida e no que se quer construir pessoalmente e profissionalmente.

por Marcelo Veras
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